Quem nunca ouviu dizer por aí que a profissão de advogado não deverá existir em um futuro próximo? Normalmente, no começo do ano, sempre nos deparamos com aqueles artigos sobre tendências futuras e previsões, que muitas vezes não passam de algum tipo de sensacionalismo para atrair o leitor. Contudo, não deixa de ser verdade que muitos colegas, têm conversado comigo sobre essa questão, com questionamentos sobre como será o futuro da advocacia. Mas, afinal, o que é o tal do Direito 4.0 e qual é a sua influência no mercado jurídico?
Lawtechs, jurimetria, smart contracts, chatbots… a cada dia nos deparamos com novas nomenclaturas desenvolvidas na era da Inteligência Artificial (IA) em nosso ambiente de trabalho. Segundo a International Data Corporation, os gastos com IA terão um aumento de quase 600% até o ano de 2020, chegando a marca de US$ 47 bilhões em investimentos. No mercado jurídico, estes investimentos têm sido cada vez maiores e seus impactos começam a gerar mudanças significativas na realidade dos escritórios e departamentos jurídicos.
No início deste século o setor jurídico começou a sua automação. Softwares de gestão se tornaram ferramentas imprescindíveis para a rotina do profissional do direito que passou a contar com um processo de trabalho eletrônico. Com informatização da justiça, houve uma melhoria na gestão dos processos, trazendo maior organização e eficiência ao enrijecido setor jurídico.
Sem dúvida, a utilização da IA tem impulsionado uma revolução digital do Direito. Diferentemente dos softwares de gestão, ela exerce uma capacidade cognitiva, de contínuo aprendizado através da pesquisa e análise dos dados gerados no setor. E isso se reflete em vários benefícios para o setor tais como a redução de custos, a economia de tempo, o aumento da produtividade dos escritórios e departamentos jurídicos, mais precisão na análise de dados e maior democratização ao acesso a justiça. Além disso, vale destacar que a IA pode ser aplicada tanto no setor privado, quanto no setor público, trazendo grandes avanços aos tribunais que poderão trabalhar com maior eficiência na condução dos processos.
Um bom exemplo disso é o uso da jurimetria (estatística aplicada ao direito), para identificar as causas e os motivos de processos contra uma empresa e, assim, alterar os processos de gestão e de tomadas de decisão, evitando o aumento de novos processos e diminuindo as despesas com aqueles já existentes. Será possível também identificar casos e performances das empresas em relação ao seu mercado, aumentando assim o foco em prevenção e geração de informações relevantes para a gestão estratégica das companhias.
Outra realidade que já vemos em nosso país são as Startups jurídicas. As Lawtechs ou Legaltechs, como assim são chamadas, buscam criar serviços que se destinam a resolver problemas cotidianos dos profissionais de Direito. Os robôs jurídicos criados por estas Startups vêm causando um furor no mercado, justamente por diminuir a burocratização dos escritórios e departamentos jurídicos. Com isso, o profissional tem mais tempo para focar em suas teses e estratégias, economizando tempo e custos com mais eficiência.
Em meio a toda estatística e matemática, temos que lembrar que acima de tudo a ciência do direito é uma ciência humana. Entre os algoritmos e dados que podemos desenvolver para nos auxiliar, e melhorar nossas habilidades e competências enquanto profissionais, sempre haverá margem para aquele componente imprevisível: Nós, seres humanos e nossa complexidade existencial e evolutiva.
Não creio que teremos o fim da advocacia ou qualquer coisa próxima a isso. Deixemos o sensacionalismo de lado. Haverá, sim, o fim do modelo tradicional que hoje permeia os tribunais e o nosso dia-a-dia de trabalho. Os profissionais que não entenderem as mudanças que a IA está trazendo e não se aperfeiçoarem, serão cartas fora do baralho.
Mas, é preciso entender também, que hoje há um grande déficit de qualificação profissional. E uma boa parcela disso se deve ao modelo que ainda é empregado nas instituições de ensino jurídico. É necessária uma transformação na forma obsoleta em que a maioria destas instituições de ensino do nosso país formam os futuros operadores do direito. Há uma defasagem muito grande entre o recém-formado e o mercado em que ele irá se deparar fora da faculdade. As universidades precisam se adequar a essa nova realidade.
Cabe então ao profissional do direito se manter focado no futuro das relações jurídicas, nos novos recursos trazidos pela Inteligência Artificial e, sobretudo, na sua capacitação para o uso destas novas ferramentas. É hora de quebrarmos paradigmas do passado para que possamos aplicar os novos métodos e modelos trazidos com a revolução cibernética. Bem-vindos ao Direito 4.0!
Por: Guilherme Marinho
Advogado Associado na Alves Oliveira