Diante das inovações tecnológicas, como o surgimento das redes sociais, o armazenamento e compartilhamento de dados e o acúmulo de patrimônio nos meios digitais se tornou uma realidade. Assim, surge a necessidade de falarmos sobre
a herança digital.
 

Primeiro, é necessário entendermos que o patrimônio de uma pessoa, ou seja, aqueles bens que possuem valor econômico, são objeto de sucessão, ou seja, o patrimônio de alguém é transferido, após a sua morte, aos seus herdeiros, por meio de lei ou testamento.

Herança é o conjunto de bens, direitos e obrigações, que uma pessoa falecida deixa aos seus sucessores. Por sua vez, os bens digitais são aqueles armazenados de maneira digital, que contenha ou não conteúdo econômico. Assim, a herança digital é um aglomerado de ativos digitais, como e-mails, contas de mídias digitais, suas respectivas senhas, redes sociais, fotos, vídeos, “nuvem de arquivos”, dentre outros, deixados pelo falecido.

Em linguagem técnica, bens digitais “são instruções trazidas em linguagem binária que podem ser processadas em dispositivos eletrônicos, tais como fotos, músicas, filmes” etc., incluindo-se também, mensagens, postagens e contas de redes sociais.

No Brasil, ainda não existe uma legislação específica sobre o tema, porém, com o crescimento dos bens digitais, esta discussão está ganhando cada dia mais repercussão e importância, acarretando inúmeras demandas ao judiciário.

Existem diversas propostas legislativas. O Projeto de Lei n. 4.099/2012 que visa garantir aos herdeiros a transmissão de todos os conteúdos de contas e arquivos digitais e o Projeto de Lei e 4.847/2012, que dispõe sobre a definição dos ativos incluídos na herança digital e prerrogativas dos herdeiros, como por exemplo, a possibilidade de excluir contas de redes sociais ou mantê-las como forma de memorial.

Acontece que ambos projetos foram arquivados, mas deram espaço a novos projetos de lei, que aguardam tramitação no Congresso Nacional, os quais visam conferir privacidade e intimidade ao falecido.

Na prática, vale destacar um caso em que uma mãe processou o Facebook por ter apagado a conta de sua falecida filha, uma vez que a genitora queria recordar fatos da vida da filha e interagir com amigos e familiares. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou o pedido de indenização por danos morais, indicando que a filha havia aderido aos termos de serviço da plataforma que previam a exclusão do perfil em caso de óbito.

Na ausência de legislação específica, recomenda-se a opção por um testamento para regular estas questões. Importante esclarecermos que o inventário deve ser instaurado no Brasil, quando os bens estão situados no território brasileiro, inclusive quanto aos bens digitais, como as redes sociais de valor econômico e ainda aqueles bens armazenados em nuvens.

Sabemos que alguns direitos são personalíssimos, e, portanto, intransmissíveis, extinguindo-se com a morte se deu titular, como por exemplo os dados pessoais dos usuários falecidos, não sendo transferidos aos herdeiros.

Porém, nos dias atuais, com a repercussão das mídias sociais, os interesses digitais, inclusive aqueles com conteúdo patrimonial, podem  ser objeto de transmissão aos herdeiros.

Essa transmissibilidade é aceita se o Autor da herança autorizasse por testamento, para evitar discussões nessa seara após sua morte.

Certamente a continuidade de uma espécie de “personalidade virtual”, do falecido, deve ser enquadrada como um bem passível de transmissão. Além do próprio “perfil” digital do falecido, seus seguidores em redes sociais também constituem objetos de interesse, uma vez que estes possuem o potencial de gerar capitalização ao detentor da conta.

 Portanto, a melhor opção é o titular ainda em vida, dispor acerca da destinação de seu patrimônio digital, deixando claro se permitirá a alguém ter acesso às suas informações personalíssimas, ou não, deixando assim um testamento digital.

nas hipóteses em que genitores buscam acesso às contas de seus falecidos descendentes, o debate deve ser ampliado para conferir os limites da autonomia dos pais e mães sobre as contas de seus filhos e filhas, respeitando-se a privacidade daqueles que os deixaram.

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Bianca Figueiredo – Advogada na área de Direito de Família, na Alves Oliveira. Graduada pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. 

Guilherme Belmudes – Sócio Coordenador na área de Direito Digital, na Alves Oliveira. Graduado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.